O papa andou dizendo algumas "pérolas", recentemente. Daí nosso presbitério pediu-me que eu reagisse com uma prédica no Culto do domingo, dia 15 de julho de 2007. Resolvi compartilhá-la com vocês. Comecei-a assim...
...A Congregação para a Doutrina da Fé da Igreja Católica Apostólica Romana publicou, recentemente, um documento, intitulado "Respostas a dúvidas sobre alguns aspectos relativos à doutrina sobre a Igreja". Nele está explícito que a "Igreja, como sociedade constituída e organizada neste mundo, subsiste na Igreja Católica". Ou seja, sustenta-se no referido documento que a Igreja Católica seja a única Igreja no mundo que possui "todos os elementos" da Igreja instituída por Jesus. Não concordamos com isso e, para deixarmos bem clara a nossa posição, meditaremos sobre o texto de Mateus 16.13-20 que passo a ler...
16.13 - Indo Jesus para os lados de Cesaréia de Filipe, perguntou a seus discípulos: Quem diz o povo ser o Filho do Homem? 16.14 - E eles responderam: Uns dizem: João Batista; outros: Elias; e outros: Jeremias ou algum dos profetas. 16.15 - Mas vós, continuou ele, quem dizeis que eu sou? 16.16 - Respondendo Simão Pedro, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo. 16.17 - Então, Jesus lhe afirmou: Bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue que to revelaram, mas meu Pai, que está nos céus. 16.18 - Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. 16.19 - Dar-te-ei as chaves do reino dos céus; o que ligares na terra terá sido ligado nos céus; e o que desligares na terra terá sido desligado nos céus. 16.20 - Então, advertiu os discípulos de que a ninguém dissessem ser ele o Cristo.
PEDRO E SEUS SUCESSORES
No texto, Jesus dialoga com seus discípulos. Pedro é destacado por Jesus como um símbolo, como uma pedra sobre o qual a Igreja cristã deve ser construída. Se usa e se abusa desta passagem para sustentar a figura do papa, aquele que tem o poder para manejar as “chaves” que ligam e ou desligam pessoas dos céus.
Nós luteranos compreendemos esta Palavra Bíblica de forma bem diferente. É pela fé em Jesus Cristo que podemos chegar a Deus e isso, sem qualquer intermediação de representantes. Para nós, Jesus Cristo é o sujeito principal da Igreja e ponto final. Nós cremos que a Palavra que Jesus dirige a Pedro em Mateus 16.18b “... tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja...” , é direcionada para a Igreja em sua pluralidade. Tu és pedra, eu sou pedra, nós somos pedra, a Paróquia São Mateus é pedra...
Nós evangélicos não vemos fundamento bíblico para a hierarquia eclesiástica histórica e automática. O critério para seguir-se a Jesus Cristo é confessá-lo tal como Pedro o fez quando disse “...Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo...” (Mateus 16.16b). Pedro não é e nunca foi critério para chegar-se ao Reino de Deus, muito menos os ditos seus sucessores. Notem que logo depois desse diálogo, Jesus dá uma bela chamada no seu discípulo: - “Mas Jesus, voltando-se, disse a Pedro: Arreda, Satanás! Tu és para mim pedra de tropeço, porque não cogitas das coisas de Deus, e sim das dos homens” (Mateus 16.23). Essa reação de Jesus foi necessária porque Pedro trocou as mãos pelos pés quando quis influir o Filho de Deus a afastar-se do caminho que leva à cruz. Resumindo, Pedro não é e nunca foi a base sobre a qual edificamos a nossa fé. Ele precisa ser visto, isso sim, como um exemplo de compromisso cristão, nada mais. A única base posta para a Igreja é Jesus Cristo. Outro fundamento simplesmente não existe.
Quem leva Jesus a sério em sua vida, já agora está livre de pecado e de culpa. Martin Luther sublinha isto quando escreve: “À Igreja de Pedro não deve mais ser permitido decidir sobre o futuro das pessoas e dos povos . Ela não deve mais amedrontar às pessoas. Não lhe cabe dominar e nem tampuco provar a fé das pessoas.” Vamos e convenhamos: muitos dos que já se sentaram na cadeira papal não foram bons exemplos para a cristandade.
A Igreja sempre só vive do testemunho de umas poucas mulheres e de uns poucos homens simples que procuram viver uma fé viva e, assim, espalhar do “bom perfume” de Cristo na sociedade em que vivem. E isto, um papa também pode e deve: ser uma testemunha do Cristo vivo, nada mais.
Confessar a fé não é brinquedo, não é coisa simples. É uma constante labuta no sentido de libertar-se da corrida desenfreada atrás do dinheiro e de outros deusinhos menores; é um constante libertar-se cada vez mais da desta idéia rasteira de querer chegar-se mais perto de Deus, usando-se para tal pessoas renomadas como ponte para tal intento; é um constante focar-se na pessoa de Jesus Cristo.
Por isso é imprescindível que exercitemos nossa prática cristã orando, meditando, louvando, cantando, dançando e festando sempre lá onde as pessoas se encontram. Toda pessoa batizada, seja ela papa, bispo, pastor, mecânico, padeiro, professora, dona de casa, jovens, crianças, idosos ou quem quer que seja, está chamada a viver debaixo desta verdade.
CONCLUSÃO
A Igreja é plural e isso, desde o Novo Testamento. Um conceito evangélico para unidade da Igreja pode ser lido no artigo VII da Confissão de Augsburgo que eu copiei no programa do nosso culto. Vamos lê-lo?... "Ensinam outrossim que sempre permanecerá uma santa igreja. E a igreja é a congregação dos santos na qual o evangelho é pregado de maneira pura e os sacramentos são administrados corretamente. E para a verdadeira unidade da igreja basta que haja acordo quanto à doutrina do evangelho e à administração dos sacramentos. Não é necessário que as tradições humanas ou os ritos e cerimônias instituídos pelos homens sejam semelhantes em toda a parte. Como diz Paulo: Uma só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de todos", etc. (Efésios 4.4ss.)
Enfim, creio que nossa tarefa como Igreja Reformada implica em nunca abrirmos mão de três pontos:
Da mensagem de Justificação: Nossa culpa não tem a última palavra. Deus nos ama – não importa de onde viemos e o que valemos. Temos que divulgar isso ao mundo que leva tanto em conta o que se é, o que se faz e o que se tem.
Da mensagem da Liberdade Cristã: Nós não estamos debaixo de ordens clericais. Para nós a Igreja é advogada da liberdade e, como tal, responsável pela divulgação desta idéia de liberdade no mundo inteiro.
Do Sacerdócio Geral de todos os Crentes: Conforme a “Theologische Erklärung von BARMEN 1934” (Esclarecimento Teológico de Barmen – 1934) entendemos a "Igreja como a Comunidade de irmãs e irmãos". Nela não existe relações hierárquicas. Sua estruturas não dominam de cima para baixo e nela não há diferenças entre sacerdotes e leigos. O mundo é o lugar onde a cristandade vive o seu dia-a-dia; onde ela vive o seu chamado e a sua profissão. Amém!
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18.7.07
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