Para início de conversa, convido à leitura de Romanos 5.1-5: 1 - Agora que fomos aceitos por Deus
pela nossa fé nele, temos paz com ele por meio do nosso Senhor Jesus Cristo. 2 - Foi Cristo quem nos deu, por meio
da nossa fé, esta vida na graça de Deus. E agora continuamos firmes nessa graça
e nos alegramos na esperança de participar da glória de Deus.
3 - E também nos alegramos nos
sofrimentos, pois sabemos que os sofrimentos produzem a paciência, 4 - a paciência traz a aprovação de
Deus, e essa aprovação cria a esperança. 5
- Essa esperança não nos deixa decepcionados, pois Deus derramou o seu amor no
nosso coração, por meio do Espírito Santo, que ele nos deu.
Há
momentos na vida em que você chega a pensar que não vai aguentar a pressão. Nestas
horas a maioria das pessoas não encontra mais força e nem vontade de lutar em
busca de perspectiva. Se este estado de espírito persiste, esvai-se a esperança.
As mulheres e os homens que experimentam este profundo estado de tristeza
acabam entendendo que o caminho do suicídio seja sua única possibilidade. Isso
é trágico!
Por
que é que tendemos a calar; a não nos informar; a não dialogarmos sobre este
assunto? Alguém de vocês, alguma vez, já ouviu alguma prédica num Culto ou já
participou de algum Estudo Bíblico onde este tema do suicídio tenha sido
colocado sobre a mesa? Sou testemunha de que, em nível de Igreja, se aborda
esta temática por alto quando é tempo da Quaresma. Nestas oportunidades se
medita sobre o tema do sofrimento pessoal e também comunitário. Dessa forma
procura-se entender; encontrar-se um sentido para este tópico tão doloroso a
partir da cruz. Notem que nos últimos dias esse foi o assunto quando pipocaram
as notícias sobre o suicídio do ex-baixista do Grupo Charlie Brown Jr. conhecido pelo apelido de Champignon.
Quase
todas as famílias são, diretamente ou indiretamente, afetadas por suicídios. Em
Blumenau (SC), de janeiro a agosto de 2013, foram onze (11) as pessoas que se
suicidaram. Pasmem! Setenta e nove (79) não conseguiram levar seu intento a
cabo. Esse dado é apenas a ponta do iceberg. De acordo com uma pesquisa
levantada nos EUA, a maioria dos jovens americanos acredita que algumas das
amigas; dos seus amigos já tenham considerado a possibilidade de suicidar-se.
Esse estudo diz que 27% dos jovens consultados afirmaram já ter pensado em
suicídio. Isso não deve ser muito diferente entre nós aqui no sul do Brasil.
Que coisa!
Tu
e eu, nós conhecemos ou já ouvimos falar de famílias que experimentaram o
suicídio de uma querida e ou de um querido das suas relações. Essas
experiências sempre deixam um rasto de muita dor, mas sobre isso quase não se
fala. Será que é por causa de vergonha e ou de culpa; da possível falta de
compreensão e ou até mesmo do medo de que isso possa acontecer novamente? A
Bíblia não diz muito sobre este tema. Será que seus autores foram
preconceituosos a respeito desse assunto? Será que a Igreja é preconceituosa? Notem
que na Bíblia a palavra suicídio só aparece sete (7) vezes. Lê-se nela que o
suicídio não é aprovado e nem tampouco condenado, mas só se comenta a respeito
dele. Moisés, Elias e Jonas oraram, certa vez, para que Deus lhes tirasse a
vida e, assim, pusesse fim aos seus sofrimentos. Graças a Deus isso não
aconteceu e eles viveram muitos anos depois desse pedido.
Que
a Bíblia seja relativamente imparcial nesse assunto se deve ao fato que ela
compreende esta dor que leva à auto-execução. Tomemos o exemplo de Saul e
Judas. É assim que quando a dor e o desespero de uma pessoa atingem níveis
insuportáveis, o suicídio não se mostra como um ato voluntário, mas como uma
reação a esta dor. Foi embasado nessa compreensão que Karl Barth, um grande
teólogo do século passado, ousou dizer: “Também o suicídio é um pecado
perdoável”. Dietrich Bonhoeffer, pastor luterano e ex-prisioneiro da Segunda
Guerra Mundial, alertou nos seus escritos para que não “superestimássemos o
último momento”. Ele entendia o ato do suicídio como uma “baixeza”, mas, ao
mesmo tempo, tinha clareza de que uma pessoa que passasse por tão extrema
experiência também poderia ser perdoada pela graça de Deus.
Saul,
o primeiro rei de Israel, contribuiu grandemente para o seu país, mas também
precisou suportar sofrimento inimaginável. Ele, certo dia, no campo de batalha,
tirou sua vida com a própria espada. Ele tinha sido vitorioso em tantas
batalhas e até foi ovacionado por sua gente, mas mesmo assim acabou não vendo
futuro para si. Ele era um homem que amava a Deus, mas isso não lhe oportunizou todas as forças
necessárias para vencer sua crise. Como já frisei, a Bíblia não toca com
profundidade no assunto suicídio, mas diz muito sobre o perdão, sobre a
compaixão e, acima de tudo, sobre a esperança. Que esperança? Não! Não se trata de uma esperança etérea, mas
de uma esperança alicerçada na terra; na vida; na morte e na ressurreição de
Jesus Cristo. Paulo foi claro: Foi Cristo quem nos deu, por
meio da nossa fé, esta vida na graça de Deus. E agora continuamos firmes nessa
graça e nos alegramos na esperança de participar da glória de
Deus. Porque
nós somos salvos pela fé na esperança.
Essa
esperança da qual Paulo nos fala em Romanos 5.1-5 só pode se desenvolver em nós
através da provação e do sofrimento. Paulo tinha ciência disso e nós também
podemos tê-la. Ele escreveu: Os sofrimentos produzem a
paciência, a paciência traz a aprovação de Deus, e essa aprovação cria a
esperança. Essa esperança não nos deixa decepcionados. Então, não desanimemos
se porventura tivermos que experimentar sofrimento. O sofrimento pode nos
enraizar na fé, fortalecer, aprofundar a nossa esperança. Por isso, estendamos
a nossa mão àquelas e àqueles que, por decepção ou separação, estão precisando
suportar grande dor. Lembremos a estas pessoas que também elas podem experimentar
a esperança apontada porJesus Cristo.
Ouso
dizer que é nesta esperança que repousa a nossa melhor esperança. Na Carta aos
Romanos nós lemos sobre o amor de Deus do qual nada, absolutamente nada, pode
nos separar: Em Romanos 8.38-39 nós lemos que nada pode nos separar do amor de Deus: nem a morte, nem a vida; nem os
anjos, nem outras autoridades ou poderes celestiais; nem o presente, nem o
futuro; nem o mundo lá de cima, nem o mundo lá de baixo. Ora, isso também quer
dizer que nem as nossas falhas
e até mesmo os nossos momentos de desespero podem nos afastar do amor de Deus.
Isso é assim porque o amor e a esperança que estão em Cristo Jesus nos mantém
firmes na vida e na morte, inclusive na vida eterna.
Um comentário:
Muito oportuna a sua reflexão, pastor Renato. Você tem razão. O debate do tema suicídio é um grande tabu na igreja e fora dela. Os protestantes têm uma triste relação com o tema. Lembro que no cemitério de Rio do Sul havia um canto, fora dele, reservado para os "renegados", entre eles estavam os que cometeram suicídio. Na minha infância e adolescência foi ali que eu tive o primeiro contato com o tema. Um misto de estupefação e rejeição a este tipo de julgamento sempre me acompanhou, inclusive no pastorado. Tanto que jamais aceitei o prejulgamento de que os suicidas "vão para o inferno" e nunca enterrei alguém "fora do cemitério".
Mas não é só na igreja que o tema é tabu. Existe um acordo tácito em todos os jornais diários de grande circulação e nas emissoras de TV de não dar manchete a suicídios. O motivo é óbvio e comprovado pelas estatísticas: o gesto de desespero é rapidamente imitado por outros, numa espécie de reação em cadeia.
Um terceiro aspecto importante a ser considerado no debate do tema, é a questão da saúde. Grande parte dos suicidas sofriam de depressão, uma doença hoje largamente comprovada como de origem neurológica, que é parcialmente tratável por remédios violentos, que transformam as pessoas em sua personalidade e no comportamento. Portanto, suicídio é um grave problema de saúde pública.
E um último aspecto que quero acrescentar ao debate é a questão social do suicídio. A nossa sociedade é terrível. Rejeição, bullying social, julgamento impiedoso, preconceito, fundamentalismo que sempre cobra mais fé do outro e muitos outros aspectos contribuem decisivamente para que alguém chegue ao extremo de suprimir a própria vida. Ouso dizer que nem sempre, ou melhor, quase nunca (!) o principal culpado pelo ato extremo é o próprio suicida. Assim sendo, o gesto de sepultá-lo fora do cemitério comunitário é um último ato de bullying coletivo para com o pobre coitado que, não suportando o peso da mão que julga, resolveu encurtar a sua vida dramaticamente...
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